águas

nas últimas semanas, me vi algumas vezes na situação de detentor da palavra, em sala de aula. o mestrado em teoria literária, modalidade esportiva que venho praticando desde 2006, me obrigou a proferir quatro palestras em turmas da graduação em letras. vale contar?

a primeira delas seria sobre o paulo leminski. umas 15 meninas ouvindo, parece que homem não passa em vestibular para letras. não tive tempo de preparar nada, o tiro se produziu sozinho. fui falando, falando, acessando o cara, sua obra, mergulhando o mais profundamente. fez-se a luz, o pão de queijo deu liga, de repente o verbo se fez carne. embargo imposto pela emoção, perdi a voz. vontade incontrolável de chorar. sensação clara (não estou sendo cardecista): de tanto chamar o cara, ele ali do meu lado. fez-se o silêncio. com o pouco que restava da voz, pedi desculpas, pedi um tempo com as mãos. desfalecimento total. se eu estivesse sozinho, rebentava de chorar alto. mas o pudor. com os 20 segundos de constrangimento, entra a voz muito doce da eni, coordenadora do projeto: danilo, tá tudo bem, muito legal isso, fica à vontade. com o minuto completo naquela situação, tentei dar a palestra por encerrada, sacudindo as mãos, dizendo com elas: é isso, acabou. nunca tinha experimentado choro tão tenaz. a carne se fez silêncio, senti que de alguma forma o leminski vivia no meu choro, naquele vazio.

aí ontem foi dia de falar do oswald de andrade. essa ocasião me lembrou de outra, na graduação, em que eu deveria falar do tal do antero de quental, poeta português que nunca tinha visto mais gordo, nem cheguei a ver depois. como eu não tivesse estudado bosta nenhuma, e estava obrigado a falar qualquer coisa, me veio o insaite, na sala de aula, pouco antes de tomar a palavra. descobri o dia em q o cara nasceu, logo descobri seu signo, e comecei a falar mais ou menos assim: "bom, o antero nasceu tal dia, logo é do signo de áries. como um bom ariano, ele devia ser um cara bastante assim, talvez assado. olha esse trecho aqui. típico de ariano". foi divertido, a professora entendeu q nada pode ser muito sério em sala de aula, e foice.

pois. tentando descobrir o signo do oswald, percebi q o aniversário dele era exatamente... ontem! pensei, crítico místico-literário que sou: virgem. fizemos um minuto de conversa em sua homenagem (nada a ver um minuto de silêncio com o oswald de andrade), e iniciamos a imersão.
Toda a verdade do mundo está em sair das coisas com os cabelos molhados.

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